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“As Forças Armadas funcionam como o substituto de um partido para sustentar Bolsonaro”, falou Dilma

A ex-presidente Dilma Rousseff concedeu uma entrevista ao site El País.

26/06/2020 às 16h50
Por: Jéssyca Seixas Fonte: Metrópoles
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Dilma Rousseff tem dividido seu tempo durante a pandemia entre participar de debates políticos online, ler sobre o passado e o futuro do mundo e, de vez em quando, ficar com os netos Gabriel, de 9 anos (“um adolescente”), e Guilherme, de 4, isolados como ela no bairro Tristeza, em Porto Alegre. Na escolha das leituras, a ex-presidenta que comandou o Brasil de 2011 a 2016 e conversou com o EL PAÍS em 10 de junho, não deixa dúvidas sobre o que lhe preocupa: está lendo M, o filho do século, uma biografia de Benito Mussolini escrita pelo italiano Antonio Scurati.

Na entrevista de quase uma hora ao jornal, transmitida ao vivo, Dilma não hesitou em classificar o Governo Bolsonaro como de cunho neofascista e em enxergar em sua cúpula o desejo de uma ruptura institucional. “É o sonho de consumo da cúpula deste Governo. A mim causa pânico. Porque seria mais grave do que a ditadura militar, com um quadro marcadamente fascista e miliciano”, afirma ela. Nesse quadro, ela vê na aproximação “notória” do Planalto com as milícias uma contradição para as Forças Armadas, que “ocupam no Executivo um papel estratégico, porque parece que funcionam como substitutos à inexistência de um partido político que dá sustentação ao Bolsonaro”.

Para a ex-presidenta sacada do poder por um impeachment e 2016, os aspectos mais preocupantes da atual conjuntura política são dois. O primeiro é o apoio que o Governo ainda tem em setores da elite financeira, das Forças Armadas e das polícias ( “Até onde vai a flexibilidade daqueles que ainda apoiam Bolsonaro? Até onde eles vão? Até a ruptura?”). O segundo é a natureza da ruptura que ela acredita estar em curso com Bolsonaro, que não se dará como num golpe clássico dos anos 60 e 70. A estratégia, ela analisa, é radicalizar e, a depender da reação, recuar —embora nunca totalmente—, acumulando um saldo corrosivo para a democracia. “Se compararmos a democracia a uma árvore, a ditadura militar vai lá e corta a árvore. Nos novos golpes que começam a ocorrer —sou um deles, com um impeachment sem crime de responsabilidade—, é como se a árvore fosse invadida por fungos e parasitas, que corroem por dentro as instituições”, disse.

Toda sua análise passa por ver seu processo de destituição e a própria Operação Lava Jato como parte de uma engrenagem que levou Bolsonaro ao poder. Daí seu alinhamento com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva nas críticas a manifestos anti-Planalto como o Juntos, que reuniu apoiadores de seu impeachment, como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Apesar de frisar que não integraria, por exemplo, uma frente anti-Bolsonaro com o ex-ministro da Justiça Sergio Moro (”Ele é diretamente responsável, figura central na chegada do Bolsonaro”), a principal crítica da petista ao manifesto é programática: “Juntos para quê?”, provoca. “Historicamente, assinar manifesto não constitui frente. Constitui frente um projeto mínimo. Não posso estar junto para nada. Tem que estar junto para tirar o Bolsonaro e colocar algo no lugar. A frente tem que ter um programinha mínimo. No Brasil, só tem um jeito de salvar a democracia: é tirar o Bolsonaro”, disse ela que, dias após a entrevista, assinou o manifesto “Mulheres derrubam Bolsonaro”.

Seja como for, a petista vê os manifestos como apenas um dos elementos no debate em torno da continuidade ou não do atual Governo. Além do apoio das fatias da elite, a falta de mobilização social contra o Planalto, num contexto dificultado pela pandemia, deixa o cenário da saída do presidente ainda distante, avalia a petista. “Se eu fosse pessimista, eu não levantava da cama. Não sou pessimista. Sou uma pessoa que tem aquilo que o Gramsci dizia: o pessimismo da razão e o otimismo da vontade. A vontade transforma. Mas você tem de olhar a realidade como ela é. O que acho é que temos que construir as condições para tirar Bolsonaro”, reflete.

Enquanto isso não se dá, a ex-presidenta vê com a apreensão o Brasil que navega a crise sanitária e econômica. Ela não descarta “catástrofe” ou “caos social” caso o Governo não estenda por mais tempo o auxílio emergencial aos mais pobres e informais. A petista também vê com desconfiança, e não como uma etapa para uma futura renda mínima, a proposta anunciada por Paulo Guedes para modificar o Bolsa Família e outros programas sociais —reconhece que “teria sido melhor” se o PT tivesse transformado o programa de transferência de renda em lei: “O que o Paulo Guedes quer é fazer economia nas costas dos mais pobres”, critica.

Já, no mundo, Dilma acredita que pode se apresentar uma saída progressista para crise: “Vai haver um aumento da tributação sobre grandes riquezas, sobre patrimônio e sobre ganhos de capital. Por quê? Porque não tem de onde tirar dinheiro”, prevê. “Não só eu falo isso. Fala também Martin Wolf, o maior economista político do Financial Times, uma pessoa que não pode ser acusado de bolivariano…”.

Sobre o cenário eleitoral, a petista vê um ambiente volátil. O que está acontecendo no EUA, que foi detonado pela morte absurda de George Floyd, é essa explosão de raça e contra a desigualdade. Ela pode surgir no Brasil. Nós não sabemos como é que as pessoas vão viver sua situação de violência, de desigualdade e de racismo e de doença. Isso vai influenciar as eleições municipais”, analisa. E sobre 2022? Para ela, ainda é cedo para traçar rumos, embora trace uma linha que pode ser definidora: afirma que seu mentor Lula, que segue inabilitado legalmente de concorrer à presidência por causa da condenação por corrupção, não deseja entrar na disputa. Quem, então? Ela cita outros nomes “do mesmo campo”, como o governador do Maranhão, Flavio Dino (PCdoB), mas não Ciro Gomes (PDT), evidenciando as feridas ainda abertas de 2018.

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