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Venezuelanos têm rotina 'quase militar' no entorno da rodoviária de Manaus

Ordenamento imposto pela operação ‘Acolhida’ determina que imigrantes devem deixar o espaço às 6h30. O local funciona como uma espécie de albergue

04/09/2019 às 09h24
Por: Fernanda Souza Fonte: Acrítica
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Reprodução
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Uma rotina diferente tem tomado conta da vida dos venezuelanos que vivem no entorno da Rodoviária de Manaus e de quem passa no local, desde o início da operação “Acolhida”, deflagrada no mês passado. No espaço, as tendas tomaram conta da paisagem e à noite funcionam como uma espécie de albergue, onde os imigrantes recebem barracas para pernoitar.

Quem antes tinha uma tenda improvisada fixa nos canteiros próximos da rodoviária, no bairro de Flores, hoje tem que pegar a barraca cedida pelo Exército e devolver no dia seguinte antes de sair para o trabalho ou em busca dele. Muitos ainda permanecem na área durante o dia e algumas vezes insistem em ficar o dia inteiro dentro das tendas, o que não é permitido pelos soldados que fiscalizam o local.

 “As pessoas não foram retiradas daqui, elas foram reordenadas. Isso aqui não é um abrigo, é um albergue. Eles vêm para cá pernoitar somente. Então, eles pegam as barracas, emprestadas sobre cautela, deixam um documento e saem com a barraca, montam e pernoitam. No dia seguinte, por volta das 6h30, eles levantam e vão trabalhar. É esse o ordenamento aqui da rodoviária”, explicou o coronel Ademar Neto, um dos responsáveis pela operação “Acolhida” em Manaus.

Sem emprego

Um dos imigrantes que vivem essa rotina é o comerciante Jezu Matos, 50, que desde a semana passada vive essa nova etapa e ainda não conseguiu encontrar um emprego. Na tarde de ontem, durante a presença da reportagem de A CRÍTICA no local, ele, que chegou em Manaus há cinco meses, aguardava a hora de pegar a barraca, mas reclamou da assistência dada aos imigrantes na área. “A gente tem o horário certo para pegar e devolver a barraca no dia seguinte, mas eles não dão comida e o banheiro nem sempre tem água para tomar banho. Hoje eu não comi nada ainda e nem consegui um bico para comprar. Estou procurando emprego, mais ainda não achei nada. Está difícil”, afirmou.

Segundo o coronel Ademar Neto, são pelo menos 200 venezuelanos que devem fazer essa rotina até que seja iniciada a nova etapa da operação. “Hoje, nós estamos na etapa de interiorização. Já passamos pela etapa de ordenamento da fronteira, abrigamento em Roraima e Manaus e agora estamos na fase da interiorização. Isso vai ficar até a gente conseguir interiorizar esse pessoal. Tirar aqui de Manaus como aconteceu em Roraima e  eles foram divididos para outros estados. Ainda não tem uma data especifica para começar. Estamos montando um posto de interiorização e triagem na Torquato Tapajós. Quando esse posto começar a funcionar, nós vamos começar a nova etapa”, disse.

Sobre a dificuldade e insistência da permanência de alguns imigrantes na área das tendas ou possível montagem de barracas próprias no espaço com a chegada de novos imigrantes, o coronel disse que o órgão não tem tido problemas. “Hoje não temos dificuldades sobre a retirada deles, dos que chegam. A gente conversa com eles e informa. A polícia dá um apoio, porque o Exército está aqui como uma mão amiga, uma ação humanitária, nós não temos armamento e nem estamos atuando como Garantia da Lei e da Ordem. Quem tem o poder de polícia é a polícia militar. Estamos aqui como conscientização, como conversa e apoio”, disse. 

Creche para pais trabalharem

A ação é parte da operação “Acolhida”, organizada pelo governo federal  e órgãos estaduais e municipais. Além das barracas cedidas pelo Exército os imigrantes recebem apoio no Posto Referência e Atendimento (PRA), onde atuam os órgãos envolvidos na ação.  “No posto de atendimento eles tem banheiro, lavanderia, local para secar roupas, guarda volume, um espaço para crianças, uma creche para que os pais deixem os filhos para ir trabalhar. Todo o apoio é dado para eles”, garantiu o coronel Neto.

 Representantes do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur) também prestam apoio aos refugiados do local.

Barracos incendiados

Os últimos barracos construídos por venezuelanos nas imediações da rodoviária foram removidos na manhã de ontem por soldados do Exército Brasileiro, em uma nova etapa da operação “Acolhida”. A ação foi criticada pelos imigrantes que acusaram os soldados de atearem fogo em roupas e materiais utilizados na confecção dos abrigos improvisados para forçar a saída do grupo.

“Dois soldados vieram de manhã aqui e colocaram fogo nas roupas. Diziam pra sairmos daqui”, conta Alejandra Martí, 34, que com dois filhos pequenos integrava o  grupo de aproximadamente 30 venezuelanos que resistiram às remoções oferecidas por órgãos do Governo do Estado, com o apoio operacional do Exército, na última quinta-feira.

“A ação começou com eles [os venezuelanos] mesmos. Foi uma retaliação ao nosso trabalho”, disse um dos oficiais do Exército que pediu para não ser identificado. Questionado sobre o princípio de incêndio que atingiu parte dos barracos, outro oficial afirmou que “não viu” e preferiu não comentar.

Para a refugiada Francesca Rodriguez, os militares se utilizaram mecanismos desumanos para conseguir a saída do grupo. “Eles agem com muita força, às vezes. É uma falta de direitos humanos. Não somos ladrões”, conta a venezuelana, que afirma ter presenciado os soldados ateando fogo em materiais para dispersá-los do local pela manhã. Ela também foi uma das imigrantes que abandonou os abrigos para voltar a morar nos barracos da rodoviária. “Eu saio daqui hoje, mas vou voltar, com certeza, porque aqui as pessoas me ajudam”, contou.

Com o tumulto, a Polícia Militar foi acionada e enviou mais de cinco viaturas para o local. Os policiais consultados pela reportagem informaram não saber o teor do chamado, mas que estavam na área para darem suporte, após o “princípio de tumulto”, aos militares e servidores do governo que atuavam na remoção dos venezuelanos.

Sobre a queima de barracos, o coronel do Exército Ademar Neto, um dos responsáveis pela operação “Acolhida” em Manaus, disse que soube do ocorrido, mas foram os próprios venezuelanos que atearam fogo. “Teve o fogo, mas foram eles mesmo que colocaram. Não teve atuação dos soldados nisso”, afirmou.

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